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O papel da cirurgia robótica na diminuição do risco de contaminação em tempos de pandemia

Com o ano de 2020 chegando ao fim, é hora de pensar nos aprendizados desses tempos tão desafiadores que enfrentamos enquanto profissionais da saúde. Nós, cirurgiões, passamos por muitas discussões acerca da segurança do paciente e equipe durante cirurgias abertas, laparoscópicas e robóticas. 

Me chamou muita atenção um artigo publicado  em outubro no periódico, o Nature Machine Intelligence, que se referiu ao uso do robô como um fator de proteção, separando fisicamente o profissional da saúde do paciente e potencialmente diminuindo os riscos de contaminação, o que possibilitaria a manutenção do volume de cirurgias. 

O problema que enfrentamos com a diminuição no número de procedimentos vai desde a saúde mental e física dos pacientes, que permaneceram sem o tratamento adequado, aos danos financeiros causados aos hospitais, que dependem da realização de cirurgias. Nesse sentido, como a cirurgia robótica que já utilizamos e as tecnologias ainda mais avançadas em desenvolvimento podem ajudar? 

A tecnologia robótica a serviço da segurança 

Até julho de 2020, mais de 1800 profissionais da saúde de 64 países diferentes morreram em consequência da Covid-19. Mesmo nos locais mais bem equipados, a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) teve impactos significativos nesses números. 

Outro desafio encontrado foi o excesso de trabalho. Acompanhamos na mídia e nas redes sociais a exaustão de todos os profissionais na linha de frente contra o coronavírus. Enquanto máquinas podem operar além da capacidade máxima por longos períodos e respiradores e leitos podem ser produzidos urgentemente, o mesmo não vale para seres humanos, que precisam de um longo treinamento para atuarem nos cuidados da população e de fato chegam, eventualmente, a um limite do quanto conseguem trabalhar.

A tecnologia robótica ajudaria muito em ambas as situações, pois diminuiria o contato do profissional de saúde com o paciente, reduzindo as necessidades de EPI e operando em máxima capacidade em situações extremas.  

Vale lembrar que a ideia de utilizar robôs para solucionar problemas humanos e otimizar processos na área da saúde não é nova: na verdade, a intenção original da cirurgia robótica era permitir a condução de um procedimento cirúrgico à distância, sem contato físico com o paciente. Hoje, utilizando o Sistema Cirúrgico Da Vinci, fico na mesma sala que o meu paciente, ainda que em extremos opostos. 

Riscos de contaminação na sala de cirurgia

A sala de cirurgia, independentemente se o procedimento é aberto, laparoscópico ou robótico pode ser uma ambiente de alto risco de transmissão de diversos tipos de patógenos. Como consequência, diversas sociedades cirúrgicas publicaram novas diretrizes de segurança para serem seguidas durante os procedimentos e minimizar os riscos. 

O uso de tecnologias robóticas em cuidados pré e pós-operatórios também poderiam contribuir muito, como no recebimento de pacientes, desinfecção da sala de cirurgia, fornecimento dos níveis de contaminação no local e até mesmo na medição de sinais vitais e assistência à beira do leito do paciente. Todas essas funções já são realidade e têm sido utilizadas em diferentes contextos, ainda que a nível de testes.

Cirurgia robótica se destaca na diminuição dos riscos de contaminação 

Os sistemas robóticos mais utilizados atualmente na realização de procedimentos distanciam o cirurgião do paciente e requerem uma equipe menor na sala de cirurgia em relação à cirurgia aberta tradicional. 

Essa medida reduz o número de pessoas expostas a aerossóis infecciosos, reduzindo ainda mais o nível de contaminação, principalmente ao utilizar o equipamento adequado para troca dos equipamentos durante a cirurgia. 

Inclusive, dois estudos recentes compararam as vantagens da cirurgia assistida por robô em relação à laparoscopia convencional em relação à contaminação por covid-19. De acordo com os achados, a pressão intra-abdominal necessária para a realização do procedimento robótico é menor e, portanto, possui menores riscos de contaminação por aerossol. 

Além disso, menos instrumentos cirúrgicos são necessários com a cirurgia robótica em comparação com a abordagem cirúrgica clássica, também resultando em risco reduzido de contaminação e limpeza mais rápida. 

Outro aspecto importante é a redução do tempo de internação hospitalar com cirurgia robótica, o que é especialmente relevante em momentos de escassez de leitos hospitalares e potencial de contaminação com internação mais longa.

Independentemente da chegada da vacina, a pandemia do novo coronavírus parece apontar para uma necessidade de distanciamento social dentro dos hospitais e entre médico e paciente mesmo em ambiente cirúrgico. Há, inclusive, sugestões da adoção de tecnologias robóticas que possibilitem a realização de procedimentos com o paciente sozinho na sala de cirurgia. 

Ao mesmo tempo em que essas medidas parecem ser necessárias em alguns casos para garantir a segurança de todos os envolvidos, me preocupa, nessa situação, como preservar a boa relação médico paciente, que é tão importante para mim enquanto cirurgião. De qualquer forma, até que essa se torne uma realidade, continuamos tomando todas as medidas para que os procedimentos sejam o mais seguros possível, explorando ao máximo as tecnologias já disponíveis. 

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